Palavra de Viajante

Guia do Banhista e do Viajante

“Espreitar pelo buraco de uma fechadura e dobrar o cabo da Boa Esperança são dois factos de curiosidade: um descobre má-criação; o outro descobre a América.”

Homem curioso, o portuense Ramalho Ortigão (1836-1915) parte à descoberta do litoral português, de Leça e Matosinhos até Setúbal, passando pela Póvoa do Varzim, Espinho, Nazaré e Pedrouços, entre outras estâncias balneares e, como se dizia na época, estações de recreio. Sendo a primeira edição datada de 1876, e considerando o humor de fino recorte do cronista, co-fundador (com Eça de Queirós) de “as Farpas”, “As Praias de Portugal. Guia do Banhista e do Viajante” é um livro de puro deleite para os leitores, seja qual for a época em que se esteja a lê-lo.

Ramalho Ortigão explora as características naturais das praias e suas águas, e fornece preciosa informação social, cultural e histórica. A escrita é tão versátil e envolvente que num mesmo capítulo se fala de carapaus e d’”Os Lusíadas”, de pianos e mulheres gordas, da ‘toilette’ e do pinhal, dos piqueniques, das tribos, das casas e dos hotéis, dos vapores para Cascais a dez tostões a ida e volta e das valsas nocturnas apimentadas com o frenesim das castanholas das banhistas espanholas de passeio por Paço d’Arcos.

Ainda que o universo balnear de hoje seja muito diferente do de então – que, como podemos ver nos antigos filmes mudos, era feito de toldos brancos, véus enfunados e leques de senhoras – este guia é realmente enriquecedor, proporcionando tudo aquilo que constitui umas férias retemperadoras: a frescura marítima, a observação da paisagem, o descanso e a deambulação, o contacto e conhecimento com habitantes locais, a comida e a diversão mundana. E as hilariantes apreciações do autor.    

Num momento em que se praticam preços escandalosamente de saldo no estacionamento lisboeta, desde que contratado por atacado e em nome de alguma estrela musical mediática, Ramalho Ortigão recorda-nos que já desde Afonso Henriques se ofereciam benesses aos estrangeiros que para aqui viessem morar: consta que Almada foi fundada por cruzados ingleses, aliciados pelo nosso primeiríssimo Rei, a trocar a longínqua e (já na altura) turbulenta Palestina pela soalheira proximidade da costa da Caparica e belas vistas sobre Belém (lugar pouco frequentado então, pois o segredo dos famosos pastéis ainda não fora inventado). Leitura refrescante, particularmente aprazível na época estival, “As Praias de Portugal. Guia do Banhista e do Viajante” é editado pela Quetzal.


Título: As Praias de Portugal. Guia do Banhista e do Viajante

Autor: Ramalho Ortigão

Editora: Quetzal

Idioma: Português

Género: Relato de viagem

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